HAICAI: POESIA E IMAGEM
de BIA SHIGUEFUZI
Período: de 07 a 25/04/2010"A escolha desta pesquisa artística recaiu sobre a relação entre o texto verbal e o não-verbal, assim como da relação entre Oriente e Ocidente.
Bia Shiguefuzi partiu dos estudos da forma poética japonesa, que surgiu no século XVI, e tão conhecida apor nós, brasileiros, que é o Haicai. Um poema sintético, de apenas dezessete sílabas, que contém uma leitura filosófica de mundo e concentra em três mínimos versos a síntese da visão do Homem e da natureza. Uma estrutura poética que foi repaginada, dois séculos depois de sua criação, por Bashô e Issa, os mais famosos haicaístas do Japão.
Após exaustivo levantamento dos elementos históricos e estruturais da delicada teia de que se constituem os haicais e sua ligação intrínseca com a natureza e as estações do ano, no Japão, a artista analisou a transposição e a criativa adaptação dessa expressão poética para um espaço tão diferenciado, quanto ao clima e à cultura, como é o Brasil.
Partindo de uma seleção privilegiada, tanto de autores que percorreram os caminhos do haicai em nosso país, como Eunice Arruda, Guilherme de Almeida e Paulo Leminski, quanto os haicais por eles produzidos, Shiguefuzi trabalhou no campo da intersemiose, interpretando-os pela sua sensibilidade, e complementando-os pela recriação desses pequenos poemas em obras pictóricas, buscando concretizá-los, através da cor e do traço, entre outros recursos estéticos, em representações imagéticas, plasmando nesses suportes estéticos os sentidos determinados pelos nossos poetas.
Trabalho sensível e sutil, reflexivo também começando pela confecção do próprio suporte que iria receber, posteriormente, a sua leitura imagética dos poemas, comprovando a delicadeza de toda uma cultura tão antiga, ao resgatar esse respeito à natureza e aquilo que ela nos oferece, como o papel e sua leveza. E esse papel, reciclado pela própria artista, é primeiro molhado e mesclado a outros papéis de cores e gramaturas distintas, diluído e centrifugado, comprimido e delicadamente alisado com as mãos para depois de seco receber o tratamento estético pela mesma artista que o recriou.
E o papel, como sabemos, tem um passado de nobreza no Japão, onde, ainda hoje, é tratado como elemento lúdico e artístico pela possibilidade de com ele desenvolver artes muito especiais como as dobraduras, o origami, na representação de animais, aves e plantas; como as luminárias, cuja transparência do material possibilita uma quase etérea passagem de luz; como as divisórias que no jogo de esconder e revelar criam curiosas imagens, assim como o livro que, apesar de toda a tecnologia de ponta, não substituiu a literatura impressa no papel pelo e-book.
E é esse papel que vai ganhar cor e sentido pelas mãos da artista, desde o processo de sua produção até a delicada arte de transpor a barreira das linguagens e, partindo de pequenos poemas, de densos e representativos haicais, penetrar no mundo da abstração das formas, pelas cores e pela luz, ou ainda pela sua ausência, como representação do vazio, do silêncio, da impotência ou da finitude.
E a obra de Bia Shiguefuzi, então, delineou um novo percurso, adquiriu um perfil diferenciado, ganhou identidade e se fez livre para o mundo, independente até dos haicais que a motivaram, e assim se oferecerá à sensibilidade daqueles que puderem apreciá-la, possibilitando as várias leituras que toda obra de arte é capaz de suscitar."
Texto de Neiva Pitta Kadota – Mestre e Doutora em Comunicação e Semiótica. Participou da Banca de Avaliação da Dissertação de Mestrado em Artes Visuais de Bia Shiguefuzi, na Universidade Estadual Paulista, em 2005.
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